MISSÕES CATÓLICAS NA AMÉRICA

Ruinas de povos missioneiros no RS
A chegada de Cristóvão Colombo ao continente Americano, por
todos os desdobramentos que ensejou e pelas consequências que trouxe para a vida, tanto dos povos daqui como para os povos do “velho mundo”, pode ser utilizado como um marco da início de uma nova era, denominada pelos pensadores europeus de História Moderna. De certa maneira, as grandes navegações europeias do início desse período, inauguraram um processo que hoje chamamos de globalização, a partir de quando determinados acontecimentos ocorridos em uma determinada sociedade, repercutem em vários cantos do mundo.

Em meio a essa conjuntura de mudanças na sociedade europeia, do começo desse período histórico, esteve inserida a reforma religiosa que constitui-se na perda da hegemonia católica na Europa ocidental. Reagindo a esses acontecimentos a Igreja de Roma promoveu o célebre Concílio de Trento que decidiu, entre outras coisas, enviar padres para as Índias Ocidentais com a missão de converter os povos nativos ao catolicismo e compensar os fiéis perdidos na Europa, para as recém criadas Igrejas Protestantes, por novas almas.

Assim a conquista da América, que desenrolou-se dentro do contexto do mercantilismo, combinou o estabelecimento de pontos de comércio com os nativos pela burguesia, com a construção de fortalezas financiadas pelos Impérios ultramarinos europeus e os aldeamentos indígenas realizados pelo clero católico. A dificuldade de enviar colonos brancos para a região fez do aproveitamento da mão de obra indígena, mediante sua conversão, mais que uma alternativa, uma solução para a colonização.

Portanto, embora a priori a serviço do Vaticano, os padres missioneiros receberam apoio e agiam em aliança com as Monarquias portuguesas e espanholas que sempre mantiveram grande fidelidade as autoridades papais opondo-se firmemente contra todos os apelos protestantes, por mais populares que fossem. A resistência Católica enviou várias organizações de padres para a América, como as ordens religiosas dos Franciscanos, Carmelitas, Mercedários Capuchos da Piedade, religiosos de Santo Antônio, Jesuítas entre outros. Sobretudo a Companhia de Jesus foi a que mais se destacou nessa empreitada de reduzir e catequizar os índios, do que viria se chamar a América do Sul.

O apoio dos Reis Católicos da península Ibérica aos ativistas da contra-reforma vinha sobretudo através de caronas em navios que viabilizaram o transporte dos padres e de todo o equipamento que traziam para suas missões, que pelo caráter de viagem só de vinda, era uma bagagem considerável que incluía a sensível e pesada carga de cabeças de gado, que fez desses padres os responsáveis por introduziram a pecuária do gado bovino nos interiores da América, na maioria dos lugares em que foram os primeiros “brancos” a chegarem, navegando dessa vez pelos grandes rios que os levaram ao interior do continente com canoas e remos.

Adentrando pelo interior através das bacias hidrográficas do Rio Amazonas e do Prata (rios Paraguai, Paraná, Iguaçu, Paranapanema e Uruguai), as missões católicas colaboraram para a consolidação do domínio territorial de Espanha e Portugal sobre o novo continente, que no final do século XVI já viam a concorrência com os navegadores franceses e holandeses ameaçar o controle da exploração das riquezas dessas terras pelos pioneiros ibéricos. A catequese servia aos interesses dos conquistadores na medida em que servia para transformar os nativos em colonos que, a exemplo dos padres, aceitavam tanto a figura de Jesus como salvador, quanto os Reis católicos como autoridades políticas.

No entanto, a instalação das missões foi marcada por inúmeras adversidades e só alcançou resultados relevantes graças ao abnegado empenho dos sacerdotes católicos, em especial dos padres jesuítas. Nas primeiras investidas, padres acabaram mortos por índios, da mesma maneira que promoveram a morte de muitas tribos ao introduzirem involuntariamente doenças desconhecidas nessa parte do mundo, como a varíola e a gripe. Persistência entre tentativa e erro fizeram a eficiência jesuítica no trabalho da catequese que ao promover o encontro de povos e culturas diferentes, além de possibilitarem sincretismos, também promoveram o choque nem sempre amigável entre essas culturas.

No intuito de estabelecer e consolidar o convívio com os nativos, os religiosos das missões jesuíticas na América aprenderam as línguas nativas, criando e aperfeiçoando técnicas que facilitassem a convivência. Com isso, acabaram por abrigar e organizar muitos povos os indígenas com destaque para os guaranis com os quais os religiosos católicos construirão grandes redes de povoamentos pelo interior. As missões apresentavam características como: regime comunitário, autossuficiência e infraestruturas cultural, administrativa e econômica completas. Muitos nativos, após serem doutrinados pelos jesuítas, começavam aos poucos a se vestir e a se comportar de acordo com os costumes europeus.

Conscientes de que os recursos do Padroado chegavam irregularmente ou simplesmente não chegavam, os jesuítas desenvolveram em parceria com os índios, modelos econômicos que buscaram o autofinanciamento de suas atividades. Nesse sentido desenvolveram um rentável comércio intra colonial combinado a um comércio de exportação que envolvia entre outros produtos, as célebres “drogas do sertão” (produtos silvestres da floresta amazônica, como cacau, baunilha, urucum e guaraná) e acumularam na colônia um expressivo patrimônio, constituído por fazendas de criação de gado, imóveis, olarias, oficinas de marcenaria, etc…

Uma expressiva quantidade de documentos demonstra o reconhecimento por parte das autoridades metropolitanas da eficiência jesuítica no trabalho da catequese indígena. Além disso, suas estratégias, como o uso da “língua geral” em suas missões, possibilitaram maior integração com os costumes indígenas, embora mantivessem relações hierárquicas com os índios e, com frequência, tensionadas.

Após diversas tentativas sem sucesso, o modelo dos missionários acaba se consolidando a partir do século XVII, quando já se encontrava espalhado por uma grande parcela do interior da América. Porém, alguns setores da Igreja Católica, que discordavam dos métodos dos jesuítas, assim como uma parte dos colonizadores, que achavam a evangelização fora de propósito e os caçadores de escravos, fizeram uma forte oposição às missões jesuíticas na América.

A relação entre colonos leigos e jesuítas na Colônia foi marcada por uma acirrada disputa pelo controle da mão de obra indígena, que gerou uma extensa legislação indigenista promulgadas na Europa. Tal legislação oscilava ora a favor dos interesses dos missionários que defendiam a liberdade dos índios, ora a favor dos colonos que queriam o direito de escravizar esses povos. Essas disputas em vários momentos redundou em confrontos armados. O Papa Paulo III, em 1537, por interpelação dos Jesuítas, editou uma bulla estabelecendo que os índios tinham almas e os catequizados não poderiam ser escravizados.

Apesar dos diversos problemas encontrados, a partir do século XVIII, as missões jesuíticas na América tornam-se tão influentes que acabam acusadas de tentar criar um império autônomo. A partir de tal premissa, foram difamadas no continente europeu e na América. Em 1759, inicia-se um processo de expulsão dos jesuítas da América, que termina em 1773, com a dissolução dessa Ordem. Desta forma, o sistema de missões jesuíticas na América sucumbe e ocorre a dispersão dos povos nativos reduzidos. Debatida por historiadores, quanto aos seus méritos, as missões apresentaram em seu conjunto incontestável relevância no que se refere a organização e promoção da Colonização europeia da América.

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