A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação aprovada pelo Congresso Nacional em 1996, nasceu de um projeto substitutivo de lei criado pelo então Senador pelo Rio de janeiro:
Darcy Ribeiro era antropólogo, escritor e um ser político que chegou as altas esferas decisórias do país. Estudou, deu aula, escreveu e teorizou sobre a educação brasileira.
De um livro didático do MEC, cito um texto dele:
Além dos seres vivos e da matéria cósmica, existem também coisas
culturais, muitíssimo mais complicadas. Chama-se cultura tudo o que é feito
pelos homens, ou resulta do trabalho deles e de seus pensamentos. Por exemplo,
uma cadeira está na cara que é cultural porque foi feita por alguém. Mesmo o
banquinho mais vagabundo, que mal se põe em pé, é uma coisa cultural. É
cultura, também, porque feita pelos homens, uma galinha. Sem a intervenção
humana, que criou os bichos domésticos, as galinhas, as vacas, os porcos, os
cabritos, as cabras, não existiriam. Só haveria animais selvagens.
A minhoca criada para produzir humo é cultural, eu compreendo. Mas a
lombriga que você tem na barriga é apenas um ser biológico. Ou será ela também
um ser cultural? Cultural não é, porque ninguém cria lombrigas. Elas é que se
criam e se reproduzem nas suas tripas.
Uma casa qualquer, ainda que material, é claramente um produto
cultural, porque é feita pelos homens. A mesma coisa pode-se dizer de um prato
de sopa, de um picolé ou de um diário. Mas estas são coisas de cultura
material, que se pode ver, medir, pesar.
Há, também, para complicar, as coisas da cultura imaterial,
impropriamente chamadas de espiritual - muitíssimo mais complicadas. A fala,
por exemplo, que se revela quando a gente conversa, e que existe
independentemente de qualquer boca falante, é criação cultural. Aliás, a mais
importante. Sem a fala, os homens seriam uns macacos, porque não poderiam se
entender uns com os outros, para acumular conhecimentos e mudar o mundo como
temos mudado.
A fala está aí, onde existe gente, para qualquer um aprender.
Aprende-se, geralmente, a da mãe. Se ela é uma índia, aprende-se a falar a fala
dos índios, dos xavantes, por exemplo. Se ela é uma carioca, professora,
moradora da Tijuca, a gente aprende aquele português lá dos tijucanos. Mas se
você trocar a filhinha da índia pela filha da professora, e criar, bem ali na
praça Saens Peña, ela vai crescer como uma menina qualquer, tijucana, dali
mesmo. E vice-versa, o mesmo ocorre se a filha da professora for levada para a
tribo xavante: ela vai crescer lá, como uma xavantinha perfeita - falando a
língua dos xavantes e xavanteando muito bem, sem nem saber que há tijucanos.
Além da fala, temos as crenças, as artes, que são criações culturais,
porque inventadas pelos homens e transmitidas uns aos outros através de
gerações. Elas se tornam visíveis, se manifestam, através de criações
artísticas, ou de ritos e práticas - o batizado, o casamento, a missa -, em que
a gente vê os conceitos e as idéias religiosas ou artísticas se realizarem.
Essa separação de coisas cósmicas, coisas vivas, coisas culturais, ajuda a
gente de alguma forma? Sei não. Se não ajuda, diverte. É melhor que decorar um
dicionário, ou aprender datas. Você não acha?
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